Uma criança é um adulto em miniatura. Entre a célula-ovo fecundada, com seus 200 milionésimos de milímetros e os 60 trilhões de células do organismo plenamente desenvolvido, há não apenas um enorme aumento de tamanho mas uma tremenda sucessão de metamorfose que se desenrolam por mais de vinte anos. Trata-se do maior projeto de expansão de que se tem notícia e é impossível registrá-lo apenas em centímetros. É preciso usar outros sistemas de medida, como o termômetro. Sem a ajuda de agasalhos o bebê não conseguiria manter a temperatura de 36 graus Celsius que o corpo humano exige para funcionar direito. Afinal, a maior parte das substâncias encarregadas de segurar o calor no organismo, fabricadas pela glândula tireóide (no pescoço), está sendo consumida em uma tarefa nobre: amadurecer o sistema nervoso, para que se possa, desde o início da vida, gravar nesse computador o maior número de informações sobre o mundo onde ele vai viver.
O sistema nervoso ajusta os ponteiros do relógio biológico, despertando padrões de comportamento conforme a fase do crescimento”, explica um cronobiologista , da Universidade de São Paulo, preocupado em verificar as mudanças nos ritmos do organismo, como o de sono e vigília. “Ser pequeno é ser um grande dorminhoco”, ele exemplifica. De fato, o recém-nascido passa dezesseis horas por dia dormindo. Mais tarde a quantidade de sono diminui aos poucos, alcançando o padrão adulto por volta dos 4 anos. Não é à toa que o período em que o corpo mais espicha dura até essa idade. A hipófise uma glândula situada logo abaixo da região cerebral do hipotálamo aproveita as duas primeiras horas de sono para fabricar uma substância cujo nome é exatamente hormônio do crescimento. “Como o bebê dorme cerca de três horas, desperta, para em seguida adormecer de novo “, conclui Cipolla,” é lógico que nele essa produção acaba sendo maior.”Nas células, o hormônio do crescimento alcança o núcleo navegando por um mar de gotículas gordurosas, onde existem proteínas mergulhadas. Ali, os hormônios reagem com os genes que, assim, liberam o molde de uma proteína, sob a forma de uma molécula de RNA (ácido ribonucléico). O molde então é copiado pelas substâncias fora do núcleo. Como é preciso fazer cópias de um por um das centenas de aminoácidos que formam uma proteína, pode demorar muitos dias até a reprodução ficar pronta. Mas, quando finalmente isso ocorre, a célula aumenta de volume por conter mais proteína e, algumas vezes, se divide. Apesar de o hormônio do crescimento ser o protagonista dessa ação, ele pode contracenar com outros hormônios, como os sexuais, produzidos a partir da adolescência pelos ovários nas meninas e pelos testículos nos meninos. Além de promoverem o crescimento especialmente de músculos nos rapazes e de gordura nas moças , esses hormônios são os responsáveis pelo desenvolvimento das características que marcam na aparência adulta a oposição entre masculino e feminino. Por exemplo, barbas e seios.
O hormônio do crescimento começa a ser fabricado pelo embrião na mesma época sua entrada em cena é tão impressionante que, se continuasse se desenvolvendo no mesmo ritmo após o nascimento, o ser humano alcançaria o tamanho adulto aos 2 anos de idade. “Não que exista mais hormônio do crescimento nesse período de gestação”, esclarece Bessa Lima. “A maioria das taxas hormonais, aliás, permanecem idênticas por toda a vida. Ocorre que, à medida que se cresce, as células perdem receptores, as portas de entrada para os hormônios.”Nunca, porém, se aumenta de tamanho simultaneamente da cabeça aos pés, pois nesse jogo de abrir e fechar receptores nas células o organismo estabelece, de acordo com a sua necessidade, o que deve aumentar de tamanho em cada momento. Assim, na gestação, os braços e as pernas curtos no bebê parecem sair perdendo. A cabeça, por sua vez, é proporcionalmente maior do que em qualquer outra etapa da vida. E, como se essa vantagem inicial não bastasse, ela se torna cada vez mais larga, até o sexto mês, porque não pára de aumentar a fontanela conhecida por moleira , um espaço de até 4 centímetros entre os ossos superiores do crânio, que se fecha por volta dos 2 anos de idade. Não são tanto os cerca de 330 gramas do cérebro ao nascer que exigem essa reserva de espaço. A questão é que o cérebro é o órgão que mais cresce após o nascimento
Certamente, os ossos são os primeiros a aumentar de tamanho, definindo os limites do corpo caso contrário, se as vísceras crescessem na frente, o homem literalmente não caberia em si. “De qualquer modo, o corpo humano tenta sempre contrabalançar: o que cresce muito hoje, cresce pouco amanhã”, explica Aldo Junqueira. Por causa de sua desproporção no recém-nascido, as pernas e os braços, alternando-se em fases, são os que mais crescem na infância. Se, graças aos diversos fatores envolvidos no crescimento hormonais, nutricionais e ambientais , os braços foram além dos padrões daquela idade em seu momento de crescer, as pernas em compensação espicharão menos. A recíproca é verdadeira. E assim, nesse jogo, o produto final do crescimento são pessoas com os mais diversos tipos físicos: troncudos, franzinos, pernas longas.Na adolescência, é a vez de os ossos do tronco aumentarem e, finalmente, as vísceras comprimidas desde o nascimento descerem e se acomodarem. Nessa lei de equilíbrio, a cabeça, que já veio ao mundo com um tamanho respeitável metade do tamanho que terá na idade adulta , é a parte que menos cresce; o que não significa que sua aparência permaneça inalterada. No bebê, a mandíbula, em forma de V, possui um ângulo obtuso e, como seu ramo ascendente é bem mais curto, o queixo acaba puxado para trás, dando um aspecto arredondado à face, as órbitas, por sua vez, são maiores, criando a impressão de que a criança vive com os olhos arregalados. Após os 6 anos, no entanto, as feições se alteram: a mandíbula forma um ângulo cada vez mais reto; pois, além de crescerem os ossos faciais, começam a surgir os 32 dentes permanentes, que são relativamente maiores. O homem primitivo tinha quatro dentes a mais na boca, os quatro molares, que ainda aparecem em uma de cada 500 pessoas negras a incidência cai para a metade em brancos
ESTÍMULO PARA CRESCER
O crescimento envolve um complexo sistema de mensagens químicas. Por ordem do cérebro, a hipófise libera o hormônio do crescimento, que agirá diretamente na cartilagem dos ossos, desencadeando a formação de novas células. Além disso, esse hormônio tem uma ação indireta, reagindo com as células do fígado para formar a somatomedina C que, no final das contas. também provocará o crescimento dos ossos da mesma maneira. Na adolescência, a hipófise aumenta a fabricação de FSH e LH (do inglês Follicle-stimulating hormone ou “hormônio estimulante dos folículos” e luteinising hormone ou “hormônio luteinizante”, respectivamente), que ao chegarem aos testículos dos meninos e aos ovários das meninas estimulam a produção de óvulos e espermatozóides e dos hormônios sexuais. “Eles fazem crescer rápido, mas também aceleram o fechamento da cartilagem”, explica o endocrinologista Marcello Delano Bronstein, do Hospital das Clínicas em São Paulo.É comum aparecer em seu consultório um adolescente cansado de ser o baixote da turma: “Se os raios X mostram que ele tem pouca reserva de cartilagem para crescer, não posso receitar o hormônio sexual para ter um adolescente alto amanhã e um adulto baixo depois de amanhã”, justifica o médico. Apesar de não oferecer o mesmo risco, por ser um remédio caro, extraído de cadáveres, o hormônio do crescimento costumava ser receitado apenas em casos de deficiência da hipófise. Felizmente, graças à Engenharia Genética que conseguiu sintetizá-lo, o hormônio do crescimento já está sendo testado na Europa em crianças normais, porém com estatura inferior à média. “Se der certo”, imagina Bronstein, “nada impedirá que se cresça além dos limites dos genes. No futuro, os hormônios criarão super-homens.”
Desde o primeiro instante de vida, quando o ser humano não é maior do que um grão de areia, sua estatura final está escrita em diversos genes. “No entanto, bastam alterações em um único gene para arrasar todo o crescimento”, calcula o ginecologista Thomaz Raphael Gollop, especialista em Genética, do Hospital Albert Einstein, em São Paulo. É o caso do anão, o herdeiro de um gene defeituoso, cujo corpo desenvolve funções de adulto, mas permanece com estatura de criança. “Além disso, conforme os estímulos do organismo”, diz o médico, “podem ser feitas correções nos genes, crescendo-se mais ou crescendo-se menos do que o programado.”Acreditava-se que os genes do crescimento eram influenciados apenas por fatores físicos, como os hormônios e doenças pulmonares crônicas: com a respiração prejudicada, as células têm menos oxigênio para queimar no crescimento não é à toa que a criança com bronquite costuma ser um adulto franzino. Hoje, porém, diversos estudos provam que, da mesma maneira como o estresse pode levar a hipófise a ordenar uma maior liberação de ácidos no estômago, causando uma úlcera, as emoções negativas também diminuem a safra de hormônio do crescimento. Resultado: criança com problemas psicológicos tende a ser baixa, por mais altos que sejam os pais.
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